“Sombras e Realces” é um ensaio em desenvolvimento e sem prazo para fim. Ele surgiu despretensiosamente, como forma de fuga durante o trânsito entre as pautas que o cotidiano de fotojornalista apresenta. Acabou se tornando cada vez mais presente e virou também uma maneira de experimentar e estabelecer uma estética fotográfica própria, que se baseia nas formas presentes no cotidiano dos lugares por onde eu passo. As sombras foram um dos elementos escolhidos para a tentativa de representar e caracterizar esse momento de introspecção quando estou perdido em meus próprios pensamentos andando por aí. Na vida as vezes somos sombras de nós mesmos quando nem sequer olhamos as pessoas e o ambiente ao nosso redor. Já os realces são as infinitas maneiras possíveis desse comportamento se manifestar. Seja em um gesto, uma cena banal, uma coincidência geométrica ou um acaso abstrato que se apresente à minha câmera. “Sombras e Realces” é também uma busca pessoal por uma fotografia que aproxime as pessoas sem uma mensagem necessariamente explícita que tente impor algo ao observador. Tenta mostrar que, de certa forma, somos como as sombras. Estar perto ou longe de alguma coisa ou alguém depende do ponto de vista e das particularidades de cada um. No entanto, em essência, somos semelhantes em busca de formas de viver e de nos adaptar à luz que nos faz existir. Somos todos luz se refletindo e projetando em sombras e realces pelo mundo.
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"Shadows and Highlights" is a work in progress with no deadline. It came up to me unpretentiously as a way to escape during transit between the assignments of the photojournalist’s day-to-day life. Eventually, it became increasingly present and also a way to try and establish my own photographic aesthetic, which is based on forms found in everyday places where I step. The shadows were one of the elements chosen for the attempt to represent and characterize those moments of introspection when I'm lost in my own thoughts walking around. In life, we are sometimes shadows of ourselves when we do not even look at the people and the environment around us. At the same time, the highlights are the endless possible ways of this behavior to manifest itself. Be it in a gesture, a banal scene, a geometric coincidence or an abstract chance that presents itself to my camera. "Shadows and Highlights" is also a personal quest for a photography that will bring people together without necessarily showing an explicit message that tries to impose something to the observer. The essay attempts to show that, in a way, we are like the shadows. Being close to or away from something or someone depends only on your own point of view and the particularities of each one of us. However, in essence, we are all similar beings in a search of ways of living and adapting to the light that makes us exist. We are all light reflecting and projecting into shadows and highlights in the world.
Cuba é um lugar a parte no mundo. Tive o prazer de conhecer um pouquinho da ilha em novembro de 2014. Estive nas praias mais lindas que já vi e conheci um povo simpático, educado e extremamente alegre. Já Havana me fez voltar no tempo. É uma cidade com um cotidiano que remete a tempos que na verdade não vivi. Me faz lembrar de lugares em que nunca estive, em espaços do tempo que nem poderia estar presente. Havana me deixou intrigado e angustiado ao mesmo tempo. Andar por aquelas ruas era realmente ver uma foto a cada esquina. Cada olhada pela janela do ônibus era uma foto perdida. A cada quadra eu via referências de diversos fotógrafos que tenho como mestres passarem por mim em forma de cenas do cotidiano. A arquitetura da parte antiga da cidade é de se apaixonar e com certeza ajudou muito nesse sentimento. Um lugar ao qual pretendo voltar e uma viagem que definitivamente me modificou como pessoa e fotógrafo.
Geometria é na fotografia uma espécie de organização e hierarquização das formas, estruturas e padrões dentro do quadro fotográfico. Indo além, no entanto, devemos perceber que é também uma obra do acaso e da habilidade do fotógrafo de conseguir capturar o instante onde tudo se alinhou no lugar certo. Utilizar a geometria vai muito além de um prazer visual e estético. É uma forma de reconhecer que existe uma ordem das coisas na nossa frente que segue fluindo sempre. Vejo como sendo uma maneira de vislumbrarmos nosso tamanho real frente a imensidão das coisas a nossa volta.
É claro em fotografia, assim como na vida, certas regras podem e devem ser quebras de vez em quando. Por isso temos nessa seção também fotos que mostram um pouco da fuga da ideia restrita que a geometria prega através de detalhes e abstrações.
Através da fotografia não se procura um caminho novo, mas sim um jeito novo de caminhar por todos esses lugares escondidos no cotidiano. Afinal somos todos estrangeiros no mundo. Basta descer em uma estação diferente do metrô para perceber isso. O que me vicia na fotografia é a habilidade de mostrar a complexidade que uma cena simples do cotidiano pode ter. Embora o quadro fotográfico seja plano a possibilidade que ele tem de criarmos uma história profunda em apenas uma imagem é infinita. Basta ter uma câmera e saber reconhecer, no instante certo, que as coisas vão acontecer.
O estudo da fotografia é muito menos técnico do que parece pra muitos. Fotografar é aprender a viver ao mesmo tempo que mostramos pros outros, através de imagens, a quantidade de coisas incríveis que deixamos de ver por não prestarmos atenção. Fotografia muito mais se vive do que se faz, ou pelo menos deveria ser assim...
Tem vezes que a gente não sabe onde a fotografia vai nos levar e muito menos se vamos conseguir fotografar algo quando chegarmos lá. O que interessa na verdade é sempre a jornada, o percurso e as pessoas que se conhece no meio disso tudo. O resultado pouco importa. Ao menos para mim o que mais dá prazer é o momento pouco antes da captura da imagem. Quando estamos ali e a cena vai se formando aos poucos na nossa frente, a dúvida de capturar ou não a imagem, a concentração nos detalhes do quadro, a procura pelo angulo adequado. Tudo isso é fantástico e viciante. Essa concentração e a espera por aquele algo a mais da foto são indispensáveis. Aquele detalhe a mais que faz tudo mudar e dá vida para aquele instante. E para estar preparado pra isso tem que ter vivido a jornada. Tem que prestar atenção com o olhar fora da câmera muito mais do que o contrário. Fotografia se vive. É sim, sim e sim. Não existe talvez.
"And photography is like that. It’s yes, yes, yes. And there are no maybes. All the maybes should go to the trash, because it’s an instant, it’s a moment, it’s there! And it’s respect of it and tremendous enjoyment to say, “Yes!” Even if it’s something you hate. Yes! It’s an affirmation." - H.C.B.
Imagens feitas através do visor de uma velha EXA.I. A câmera é alemã e foi produzida entre 1962 e 1964 pela mesmo inventor das Exaktas. Nesse ensaio fiz imagens do cotidiano utilizando as diferentes texturas e cores que o visor da câmera proporcionava.
Pautas jornalísticas são incríveis pois elas levam o fotógrafo a lugares que não seriam possíveis de se conhecer em outra situação. No fotojornalismo se aprende a trabalhar com fotografia de todas as formas possíveis e enfrentando desafios a todo instante, tudo para contar uma história. Foi nessa área que descobri que ser fotógrafo é ter que resolver problemas e não inventar desculpas.
“That’s why photography is important, in a way, because at the same time that it’s a great pleasure getting the geometry together, it goes quite far in a testimony of our world, even without knowing what you are doing.” - H.C.B
Arte falada, cantada e fotografada...
Retratos que nunca foram buscados na Câmara Municipal de Porto Alegre. Fotos para documentos, currículos ou simplesmente oportunidades. Foram muitos os rostos que vi no meu tempo de estágio na CMPA. Fotografias, histórias e vidas que passam por nós no cotidiano e que muitas vezes nem notamos. Essas fotos estavam lá largadas, mas não pude deixar de vê-las. Acabaram virando esse pequeno ensaio.